sexta-feira, 4 de abril de 2014

Mãe: tudo suportou!

Amigos e amigas, Paz e Bem! Hoje, sexta-feira: dia de meditarmos sobre o mistério da nossa salvação: A Cruz. Gostaria de compartilhar esse vídeo, nele encontraremos um lindo testemunho de amor e fé: A Virgem Mãe. Ela nos ensina como suportar - com amor - as nossas "cruzes".

Abençoado dia! #Compartilhe! #TaumuJunto 

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Papa Francisco assina decreto que canoniza beato Anchieta


Beato José de Anchieta foi inscrito no álbum dos santos da Igreja por meio de um decreto assinado hoje

Da Redação, com Assessoria da Canonização do Beato José de Anchieta

Imagem oficial divulgada pela equipe de canonização do beato Anchieta / Foto: Divulgação
O Papa Francisco assinou, nesta quinta-feira, 3, o Decreto da Congregação para a Causa dos Santos que canoniza o beato José de Anchieta. Com a assinatura, o beato, “Apóstolo do Brasil”, é inscrito no álbum dos santos da Igreja por meio da canonização equipolente.

Esse tipo de canonização é uma prática utilizada no contexto de figuras de particular relevância eclesial para as quais é atestado um extenso e antigo culto litúrgico e uma ininterrupta fama de santidade e prodígios.
No dia 23 de abril, está prevista uma coletiva de imprensa exclusiva para os jornalistas brasileiros. No dia 24 de abril, está prevista outra coletiva de imprensa para jornalistas internacionais. Ambas ainda serão confirmadas e divulgadas.

No dia 24 de abril, na Igreja de Santo Inácio de Loyola, em Roma, às 18h, acontecerá uma Missa em Ação de Graças pela canonização de São José de Anchieta, que será celebrada pelo Papa Francisco.

São José de Anchieta
Nasceu em 19 de março de 1534, em São Cristóvão da Laguna, Ilha de Tenerife, Arquipélago das Canárias, Espanha. Entrou na Companhia de Jesus, em 1º de maio de 1551, em Coimbra, Portugal; após ter emitido os primeiros votos, foi enviado às missões do Brasil.
Chegando em solo brasileiro, dedicou-se inteiramente à promoção humana e cristã dos indígenas e, mais tarde, à pastoral dos negros africanos, sempre à luz do Evangelho, perseverando incansavelmente, até a morte, nessa  multiforme atividade apostólica.

Fundou o Colégio São Paulo de Piratininga, que deu origem à cidade de São Paulo, e esteve presente na fundação da cidade do Rio de Janeiro. Também se deve a ele a fundação de outras cidades brasileiras. Ordenado sacerdote em 1556, em Salvador (BA), dois anos mais tarde foi designado Provincial de todos os jesuítas do Brasil, cargo em que, durante dez anos, se notabilizou pelas suas qualidades de superior providente e chefe admirável. Nessa função, enviou os primeiros jesuítas para Assunção, no Paraguai, criando as raízes das famosas Reduções.

Escreveu, na língua Tupi, uma gramática e, depois, um catecismo, assim como diversas peças teatrais com finalidade lúdica e catequética. Destaca-se dentre sua vasta obra literária o famoso poema à Virgem Maria, escrito durante seu cativeiro junto aos índios Tamoios, em Iperoig, hoje Ubatuba (SP). Dedicou toda sua vida à evangelização do Brasil e foi agraciado com o título de Apóstolo do Brasil. Faleceu, no domingo, 9 de junho de 1597, em Reritiba, hoje Anchieta (ES).
 
A Canonização Equipolente
A praxe adotada para a canonização de Beato José de Anchieta é aquela da canonização “equipolente”, prática utilizada no contexto de figuras de particular relevância eclesial para as quais é atestado um extenso e antigo culto litúrgico e uma ininterrupta fama de santidade e prodígios. A mesma praxe foi adotada por Papa Francisco para as canonizações de Angela Foligno (9 de outubro de 2013) e de Pedro Fabro (17 de dezembro de 2013).

Formulada pelo Papa emérito Bento XVI, na sua obra De Servorum Dei beatificazione et de Beatorum Canonizatione,  tal prática é regularmente adotada pela Igreja, mesmo que não com tanta frequência. Neste tipo de canonização, o Papa estende respectivamente a toda a Igreja o culto de um servo de Deus que ainda não foi canonizado, mediante a inserção de sua festa, com Missa e ofício, no Calendário da Igreja. Trata-se, portanto, de uma sentença definitiva do Papa sobre a santidade do servo de Deus, sentença expressa não com a tradicional fórmula de canonização, e sim por meio de um decreto que determina que a Igreja venere aquele servo de Deus com o culto reservado aos santos canonizados.

Como explicado recentemente pelo cardeal Angelo Amato, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos, em um artigo publicado no jornal vaticano “l’Osservatore Romano”, para este tipo de canonização “são necessários três requisitos: a prova antiga do culto, atestado constante e comum de dignidade histórica de fé sobre as virtudes ou o martírio e a ininterrupta fama de prodígios”.

Caso essas condições sejam suficientes, “o Sumo Pontífice, por sua autoridade, pode proceder à canonização equipolente, ou seja, à extensão à Igreja do recitamento do ofício divino e da celebração da Missa sem qualquer sentença formal definitiva, sem ter cumprido nenhum processo jurídico, sem ter cumprido as consuetas cerimônias”.

São José de Anchieta, rogai por nós!


[Foto: Imagem oficial divulgada pela equipe de canonização do beato Anchieta / Foto: Divulgação]

domingo, 30 de março de 2014

Viver a Bíblia ao pé da letra?


Podemos fazer tudo o que está escrito na Bíblia?

Algumas pessoas que não entendem bem da Bíblia, ou que foram doutrinadas em algumas seitas, pensam ainda que devemos interpretar a Bíblia ao pé da letra, de maneira fundamentalista. Ora, nada mais errado e perigoso. Por isso, o Magistério da Igreja interpreta a Sagrada Escritura, discernindo o que não pode ser mudado e o que é costume da época e que não vale mais hoje. Veja, por exemplo, os problemas que teríamos hoje se fossemos viver a Bíblia dessa forma:

Ex 21,2: “quando comprares um escravo hebreu, ele servirá seis anos; no sétimo sairá livre, sem pagar nada”. Quer dizer que então podemos comprar escravos? 

Levítico 25: 44 – estabelece que posso possuir escravos, tanto homens quanto mulheres, desde que sejam adquiridos de países vizinhos. “Vossos escravos, homens ou mulheres, tomá-los-eis dentre as nações que vos cercam; delas comprareis os vossos escravos, homens ou mulheres”.

EX 21,7: “Se um homem tiver vendido sua filha para ser escrava, ela não sairá em liberdade nas mesmas condições que o escravo”. Então, podemos vender a filha como serva?

Ex 21, 15: “Aquele que ferir seu pai ou sua mãe, será morto”. Então vamos decretar a pena de morte para muita gente.

Êxodo 35: 2 – claramente estabelece que quem trabalha nos sábados deve receber a pena de morte. “Trabalharás durante seis dias, mas o sétimo (sábado) será um dia de descanso completo consagrado ao Senhor. Todo o que trabalhar nesse dia será morto.” Deveríamos, então, matar todo mundo que trabalha no sábado?

Levítico 21: 18- 21 está estabelecido que uma pessoa não pode se aproximar do altar de Deus se tiver algum defeito. “Desse modo, serão excluídos todos aqueles que tiverem uma deformidade: cegos, coxos, mutilados, pessoas de membros desproporcionados, ou tendo uma fratura no pé ou na mão, corcundas ou anões, os que tiverem uma mancha no olho, ou a sarna, um dartro, ou os testículos quebrados… Sendo vítima de uma deformidade, não poderá apresentar-se para oferecer o pão de seu Deus”.

Lev. 19,27 proíbe cortar cabelo: “Não cortareis o cabelo em redondo, nem rapareis a barba pelos lados.”

Levítico 11: 6-8, quem tocar a pele de um porco morto fica impuro. “E enfim, como o porco, que tem a unha fendida e o pé dividido, mas não rumina; tê-lo-eis por impuro.”

Levítico 19, 19 – “Não juntarás animais de espécies diferentes. Não semearás no teu campo grãos de espécies diferentes. Não usarás roupas tecidas de duas espécies de fios”. Ora, então não se poderia ter vacas, cabritos e galinhas na mesma terra. Não se poderia usar roupa de algodão misturado com poliéster como se usa hoje.

Levítico 20,9-16: “Quem amaldiçoar o pai ou a mãe será punido de morte. Amaldiçoou o seu pai ou a sua mãe: levará a sua culpa. Se um homem cometer adultério com uma mulher casada, com a mulher de seu próximo, o homem e a mulher adúltera serão punidos de morte. Se um homem dormir com outro homem, como se fosse mulher, ambos cometerão uma coisa abominável. Serão punidos de morte e levarão a sua culpa. Se um homem tiver comércio com um animal, será punido de morte, e matareis também o animal”.

Veja quanta gente teria que ser morta hoje se fossemos seguir a Bíblia “ao pé da letra” de maneira fundamentalista; mas é lógico que isso não pode ser feito. Então a Bíblia errou? Não! O escritor sagrado narrou o que se vivia de costume no seu tempo; hoje não se pode viver isso a luz da verdade e do bom senso. A moral evoluiu até que Jesus Cristo a levou à perfeição.

É por isso que a “Dei Verbum” do Concilio Vaticano II ensina que: “O ofício de interpretar autenticamente a palavra de Deus escrita ou transmitida, foi confiado unicamente ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade se exerce em nome de Jesus Cristo”. (n.10)

E São Pedro nos lembra de algo muito importante: “Nelas [Sagradas Escrituras] há algumas passagens difíceis de entender, cujo sentido os espíritos ignorantes ou pouco fortalecidos deturpam, para a sua própria ruína, como o fazem também com as demais Escrituras” (2 Pe 3, 16).


Agradecimento: Prof. Felipe Aquino

quarta-feira, 26 de março de 2014

Os Católicos adoram Maria? - NÃO! Entenda...!

Maria é a mãe de Jesus e, por isso, merece respeito. "Mas por que os católicos a tratam quase como se ela mesma fosse Deus?"
Amados e amadas, precisamos reafirmar a nossa Fé: É necessário “dar razões à FÉ”. Por isso, gostaria de compartilhar com vocês um pouco sobre o que cremos e o que devemos crer! Deus abençoe!

A Igreja ensina que a adoração é reservada somente a Deus. Ainda que não adorem Maria, os católicos a honram por ser a Mãe do nosso Senhor Jesus Cristo e uma fiel serva de Deus.

Os católicos distinguem diversos tipos de veneração, um deles específico para Nossa Senhora. O Vaticano II pede que se incentive esta veneração concreta, mas adverte tanto contra o exagero como contra a falta de nobreza de espírito, ao tratar da singular dignidade da Mãe de Deus.

A Igreja Católica distingue três tipos de veneração: "latria" (a adoração devida só a Deus), "dulia" (a honra apropriada aos santos e anjos do céu) e "hiperdulia" (uma honra especial dedicada à Bem-Aventurada Virgem Maria). Entre "latria" e "dulia" não existe uma diferença de graus, mas sim de tipos: "dulia" e "latria" são tão distantes como a criatura do Criador.

O Concílio Vaticano II afirmou claramente que "criatura alguma jamais poderá ser comparada com o Verbo encarnado e Redentor" (LG 62). Esta afirmação também é válida para a Mãe de Deus: "A Igreja não hesita em confessar esta função subordinada de Maria" (LG 62).

Ainda que o Concílio peça uma veneração apropriada para Maria, que seja incentivada generosamente entre os fiéis, também adverte contra os excessos: "Aos teólogos e pregadores da palavra de Deus, exorta-os instantemente a evitarem com cuidado, tanto um falso exagero como uma demasiada estreiteza na consideração da dignidade singular da Mãe de Deus. Estudando, sob a orientação do magistério, a Sagrada Escritura, os santos Padres e Doutores, e as liturgias das Igrejas, expliquem como convém as funções e os privilégios da Santíssima Virgem, os quais dizem todos respeito a Cristo, origem de toda a verdade, santidade e piedade. Evitem com cuidado, nas palavras e atitudes, tudo o que possa induzir em erro acerca da autêntica doutrina da Igreja os irmãos separados ou quaisquer outros" (LG 67).

Portanto, a Igreja Católica não incentiva a adoração a Maria. Os possíveis excessos entre os fiéis são contrários ao explícito ensinamento da Igreja e não representam a correta prática católica. Muitos protestantes, receosos pelos excessos da devoção mariana, tendem a ignorar totalmente Maria.
A Igreja Católica, por outro lado, dá continuidade à tendência das Sagradas Escrituras no que diz respeito a honrar Nossa Senhora.

Encontramos um exemplo em Lucas 1, 28.30: "E, entrando o anjo onde ela estava, disse: Salve, agraciada; o Senhor é contigo; bendita és tu entre as mulheres. (...) Disse-lhe, então, o anjo: Maria, não temas, porque achaste graça diante de Deus".

Outro exemplo em Lucas 1, 41-45: " E aconteceu que, ao ouvir Isabel a saudação de Maria, a criancinha saltou no seu ventre; e Isabel foi cheia do Espírito Santo. E exclamou com grande voz, e disse: Bendita és tu entre as mulheres, e bendito o fruto do teu ventre. E de onde me provém isto a mim, que venha visitar-me a mãe do meu Senhor? Pois eis que, ao chegar aos meus ouvidos a voz da tua saudação, a criancinha saltou de alegria no meu ventre. Bem-aventurada a que creu, pois hão de cumprir-se as coisas que da parte do Senhor lhe foram ditas".

Cheia do Espírito Santo, Isabel honra Maria como bendita entre as mulheres; sente-se honrada por estar na presença de Maria, já que ela é a Mãe do nosso Senhor Jesus. Nem o Anjo nem Isabel parecem pecar ao honrar Maria ou diminuir a adoração devida a Deus. Ao invés disso, ambos os exemplos demonstram que este tratamento é apropriado e não menoscaba o culto devido a Deus.
Estas duas passagens são a base da primeira parte da forma mais comum de devoção mariana: a oração da Ave-Maria. A primeira frase da oração – "Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco" – é uma simples e antiga tradução da saudação do Anjo a Nossa Senhora. A seguinte frase – "Bendita sois vós entres as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus" – foi tirada da saudação de Isabel a Maria.

Os católicos também seguem o exemplo de Jesus ao honrar Maria.

Em sua obra "Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem", o escritor do século XVIII, São Luís Maria Grignion de Montfort, destaca que Jesus, não tendo pecado, teria obedecido ao quarto mandamento – Honrar pai e mãe – e que, dessa maneira, temos de imitar Jesus honrando devidamente Maria.
Alguns opinam que Lucas 11, 27-28 é um exemplo de como Jesus nega a honra devida a Maria: "E aconteceu que, dizendo ele estas coisas, uma mulher dentre a multidão, levantando a voz, lhe disse: Bem-aventurado o ventre que te trouxe e os peitos em que mamaste. Mas ele disse: Antes bem-aventurados os que ouvem a palavra de Deus e a guardam". No entanto, sabemos, por outras passagens, que o correto é oferecer um tratamento especial a Maria. E mais: Jesus destaca que a fé de Maria é mais importante que seu papel como Mãe, já que, na última frase da saudação de Isabel, esta diz a Maria: "Bem-aventurada a que creu, pois hão de cumprir-se as coisas que da parte do Senhor lhe foram ditas" (Lc 1, 45).


Paz e Bem! #TamuJunto 

sábado, 15 de março de 2014

A RCC, um Movimento da Igreja ou uma Torrente de Graça?


Em Atos dos Apóstolos, encontramos a confirmação de como a Igreja tem sido revitalizada através da ajuda do Espírito Santo desde o início de sua vida. As primeiras comunidades, nas quais a “alegria e singeleza de coração” (At 2, 46) reinavam, eram ricas em dinamismo, abertura e zelo missionário. Estas comunidades partilhavam o partir do pão em amor fraternal, iluminadas pela Palavra, servindo uns aos outros com humildade mútua – e eram um testemunho autêntico que atraía a admiração daqueles que observavam os discípulos - estimulando em muitos o desejo pela conversão e por partilhar este novo estilo de vida. O Evangelho de São João nos oferece uma fotografia desta nova família espiritual dedicada a amar “Amai-vos uns aos outros, como eu vos tenho amado” (Jo 13, 34).

Estes irmãos daquele tempo testemunharam o poder e a eficácia da Palavra: curas, libertações, sinais e prodígios aconteceram em abundância. Nesta atmosfera, era normal viver sob a vigorosa ação de Deus, que produzia coragem renovada diante das perseguições, inspirando um amor profundo e crescente; e tudo isto era o fruto da Sua presença. Em Atos 1, 8, há uma referência específica à promessa de Jesus referente à efusão do Espírito e aos resultados maravilhosos de Sua ação em nossos irmãos daquele tempo. É certo, portanto, esperar que esta ação continuará a operar na Igreja de hoje também: toda a Igreja deve ser renovada.

Quando comparamos as primeiras comunidades de cristãos às de hoje, compreendemos que algo do amor e da intensidade daquele tempo foi perdido, provavelmente como consequência de termo-nos tornado mais burgueses e egoístas. A predisposição autêntica para com o ideal espiritual foi progressivamente diluída e substituída por um ceticismo frio que entorpece, limita e congela e, em seu pior estágio, mata. Não deveríamos talvez renovar nossa fé na promessa de Jesus que nos enviou Seu Espírito Santo no início da história da Igreja, assegurando-nos também: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28, 20)? Vimos estas palavras de Jesus se tornarem realidade em diferentes fases da história da Igreja, particularmente em momentos difíceis devido a conflitos e situações que fizeram parecer que o barco de Pedro havia afundado: a ajuda divina nunca falhou e sempre estimulou novos dons espirituais através da renovação do impulso do Espírito. Hoje também somos atores e protagonistas de uma ação renovadora poderosa na Igreja, vivendo em uma “torrente de graça” abençoada que leva o nome de Renovação Carismática, um novo convite do Senhor para um Cristianismo que se manifesta através de sinais e comportamentos evidentes, o fruto de nossa abertura à maravilhosa ação do Espírito. Esta torrente renovadora envolve toda a Igreja: não podemos reduzi-la a um simples “Movimento” ou “Associação”; é um sopro poderoso do Espírito que queima na Igreja para nos tirar de nossa indiferença e torpor. Devemos recuperar este tipo de experiência, típica das primeiras comunidades cristãs, confirmando assim o que Jesus prometeu: “Aquele que crê em mim fará também as obras que eu faço, e fará ainda maiores que estas, porque vou para junto do Pai” (Jo 14, 12).


Para aqueles que dizem que a RCC passará, podemos responder com convicção de que isto não acontecerá: a Igreja, em toda a sua história, sempre recebeu do Espírito um sopro renovador em resposta às necessidades do mundo em cada era... e assim será no futuro” Obviamente, a fim de colaborar com esta “torrente de graça” neste período da história, também necessitamos de estruturas que possam garantir um serviço adequado à Igreja e à sociedade. Com este propósito a Igreja, em sua sabedoria, considera esta “torrente de graça carismática” também como um “Movimento Eclesiástico”, canonicamente reconhecido e aprovado. Assim o Santo Padre, João Paulo II, falou em sua mensagem aos Movimentos da Igreja e às Novas Comunidades na véspera de Pentecostes de 1998 (30 de maio) na Praça de São Pedro: “É a partir desta redescoberta providencial da dimensão carismática da Igreja que, tanto antes como depois do Concílio, aconteceu uma linha singular de desenvolvimento dos Movimentos da Igreja e de Novas Comunidades”. O termo “Movimento”, portanto, se refere às entidades que frequentemente são diferenciadas umas das outras, mesmo em sua forma canônica. Este termo não é uma definição rígida, nem tampouco expressa, de forma plena, a riqueza das formas que surgem da criatividade do Espírito de Cristo que traz vida. Além disso, também indica uma entidade eclesiástica concreta formada principalmente por leigos e leigas e que consiste na fé e no testemunho Cristão que baseiam a razão de sua existência em um carisma específico concedido ao seu próprio fundador em circunstâncias específicas e através de métodos específicos. É o Espírito que funda e dá identidade à RCC. Não temos dúvida quando afirmamos que é Ele que guia a RCC no caminho que a levou a ser aprovada pela Igreja através do reconhecimento papal dos estatutos e serviços do ICCRS, em 14 de setembro de 1993, durante a Festa da Exaltação da Cruz. Não podemos deixar de salientar que estes estatutos têm ajudado muitos países na elaboração de seus próprios estatutos, capacitando  muitas comunidades locais da RCC a desempenhar fielmente tanto a missão de evangelização  - através do testemunho do amor fraternal que Jesus nos ensinou – e da difusão e promoção da “Cultura de Pentecostes”, tão ardentemente desejada por nossos amados Papas João Paulo II e Bento XVI.  Afirmar, portanto, que a RCC é uma “torrente de graça” não é uma contradição ao fato dela ser um “Movimento”. É, de fato, um movimento.... do Espírito Santo. Daí que, queridos irmãos e irmãs, convidamo-os para que, com Espírito renovado,  deixem-se ser preenchidos pela graça divina a fim de viver e servir a Igreja fundada por Jesus: a Igreja de ontem, de hoje e de todos os tempos;  a Igreja que Jesus confiou à ação santificadora do Seu Espírito!

Deus abençoe você! Paz e Bem! 

Agradecimento:  Maria Eugenia de Gongora - RCC.

terça-feira, 11 de março de 2014

O que um padre pode ensinar sobre o casamento, se ele não é casado?

Quando conto que estou cursando uma licenciatura em Matrimônio e Família, muitas pessoas costumam rir e me perguntam o que nós, padres, sabemos sobre o casamento, se não somos casados. Como um sacerdote ousa falar de uma realidade da qual ele não tem experiência?
                         
Vou começar esclarecendo um primeiro ponto: os padres são celibatários, mas isso não significa que sejam solteiros. De fato, não estão disponíveis nem livres para nenhuma mulher.

Para entender isso, é preciso ter claro que o nosso ministério sacerdotal não é "nosso" ministério sacerdotal: é o ministério de Jesus, Sacerdote eterno, o único e verdadeiro sacerdote da nova aliança.

O que os padres são e fazem não é uma mera representação da sua ação evangelizadora, mas uma participação direta da sua graça santificante, que lhes deu, em nome de Jesus, um nome, a potestade para submeter o Maligno, perdoar pecados, santificar o amor, ungir os enfermos e mostrar a beleza da sua Palavra.

Tudo isso parece muita pretensão, não é mesmo? Mas esta é a beleza e a grandeza do ministério que foi confiado aos sacerdotes. Nós, padres, não nos apropriamos de privilégios nem atributo algum; só temos responsabilidades das quais prestaremos contas diante do Senhor.

Pois bem, o apóstolo Paulo, em Efésios 5, 25-26, nos diz: Maridos, amai as vossas mulheres, como Cristo amou a Igreja e se entregou por ela, para santificá-la, purificando-a pela água do batismo com a palavra". Este texto nos mostra claramente a relação esponsal que Cristo tem com a Igreja, da qual é cabeça e ela, seu corpo, fazendo dos dois uma só unidade pelo amor. Cristo é esposo da Igreja e, por isso, se os padres são presença de Cristo na terra, então são verdadeiros esposos da Igreja.

Não estamos diante de uma simples ficção, mas de uma realidade de cunho teológico que se compreende quando permitimos que entrem no nosso coração aquelas palavras de Jesus: "Porque há eunucos que o são desde o ventre de suas mães, há eunucos tornados tais pelas mãos dos homens e há eunucos que a si mesmos se fizeram eunucos por amor do Reino dos céus. Quem puder compreender, compreenda" (Mt 19, 12).

Partindo desta perspectiva, conseguimos compreender de que maneira um sacerdote é verdadeiro esposo que tem responsabilidades como as de um casal: geram filhos no batistério e sabem perfeitamente o que significa escutar aqueles que "choram" de madrugada pedindo ajuda ao seu pai.

Os padres sabem o que é educar nas diferenças e ter de perdoar os que se afastam de casa. E sabem também de infidelidades, essas que aparecem na mídia de vez em quando, mostrando a miséria de um coração que também tenta amar e que é frágil como os outros.

Como esposos, os sacerdotes conhecem o perigo da rotina no amor e o desejo que o coração tem de buscar aventuras. Sabem o que significa deitar-se bravo com a esposa, a Igreja, e querer mudá-la permanentemente, porque ela nem sempre encanta com a sua presença.

Há dias em que a esposa Igreja parece feia, desalinhada, mas os padres aprendem a amá-la assim como ela é, e buscam apaixonar-se constantemente por ela, para jamais ter de abandoná-la para buscar amantes furtivas.

Quem acha que os padres não têm nada a ensinar sobre o amor conjugal não faz ideia do que significa ser sacerdote. E o padre que se considera solteiro, tampouco. Os padres são "esposos celibatários", duas palavras que mostram uma aparente contradição, mas que nos permitem entender melhor este mistério de amor.

Além disso, como esposos, os padres têm uma palavra oportuna, de motivação, iluminadora para aqueles outros esposos que precisam enxergar uma luz no fim do túnel, para saber enfrentar o demônio da rotina e do tédio.

Os padres têm uma palavra acertada para aqueles que não veem outra solução para o seu problema a não ser o divórcio, com a enorme frustração e derrota de não ter sabido amar para sempre e a inevitável luta para buscar a justiça, que lhes permita "repartir" os filhos, como se repartem os bens da casa.

Nós, padres, temos experiência no amor matrimonial sim, conhecemos os amores e as infidelidades, sabemos do que estamos falando.


Texto: Aleteia.org

Paz e Bem! #TamuJunto 

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

O Modernismo e os tradicionalistas paranóicos


Vários sites da Internet, em nome de certa visão estreita e equivocada do catolicismo, da Tradição e do próprio Magistério, têm feito graves acusações ao Concílio Vaticano II, além de mais ou menos veladas críticas aos últimos papas, de João XXIII a Bento XVI. Esses sites são de orientação mais ou menos próxima à Fraternidade São Pio X, do falecido Arcebispo cismático Dom Marcel Lefebvre, que faleceu excomungado: são todos eles tradicionalistas (não tradicionais, no sentido correto e sadio do termo e da Tradição católica), reacionários (não simplesmente conservadores, o que não seria mal nenhum. Reacionários porque seu estado de espírito é destrutivo, inquisitorial, de retranca, de visão estreita, arcaica e hostil a qualquer progresso na teologia, no dogma e na vida da Igreja).

O refrão desses referidos sites é individuar em todos os níveis e ambientes da vida da Igreja erros e perigos à reta fé, espalhar anátemas e condenações e fomentar uma estranha e ultrapassada guerra apologética, própria do início do século XX, em nome da ameaça onipresente da heresia modernista. Para eles, paranoicamente, todo mundo é modernista: os últimos papas, os teólogos atuais, o episcopado em geral, o clero como um todo, os vários movimentos leigos...

É mais que patente para qualquer pessoa de bom senso que esse pessoal vai rapidamente tomando o caminho do cisma. Primeiro dá-se o cisma psicológico, afetivo, que faz ver com suspeita a Igreja e seus pastores; depois, vem o cisma de fato, a incompatibilidade entre a fé do grupelho de “iluminados” e a percepção da Grande Igreja, aquela composta pelo Povo Santo de Deus em comunhão com seus legítimos pastores com Pedro e sob Pedro. Em geral – mesmo quando não diz – esse pessoal somente considera como papas sem nenhuma restrição os pontífices até Pio XII. A fidelidade deles é ao papado do passado ou, melhor falando, ao papado da cabeça deles. Os papas atuais são por essa gente julgados, crivados de crítica e manipulados nas suas intenções e magistério; se alguns deles citam Bento XVI, é de modo unilateral e desonesto, sempre manipulando o Magistério pontifício para tentar fazer o Papa dar razão às próprias irracionalidades. Que ninguém se iluda pela linguagem engomada e afetada que utilizam, cheia de “V. Revma.”, “V. Excia. Revma”, “Senhor Padre”, etc. Toda essa afetação, na verdade, somente revela um apego doentio ao arcaico e tudo que os segure no final do século XIX e início do século XX, final do pontificado de Pio IX e pontificado de Pio X.

Como muitas pessoas perguntam-me sobre esses sites e pedem-me uma avaliação sobre eles, pois que estranham a animosidade em relação à Igreja e ao Episcopado, aos teólogos e a muitas sãs manifestações da vida eclesial, resolvi descrever de modo esquemático e bem simples a crise modernista, suas conseqüências e o atual estado da questão, para que o leitor possa compreender o quanto essas pessoas nominalmente católicas, mas às portas do cisma, aparentemente tão fiéis à Tradição e ao Magistério, mas deles tão distantes de fato, estão equivocadas e distantes do reto sentir da Igreja de Cristo. Como me dirijo ao grande público, procurei ser sucinto e evitar detalhes aprofundados sobre questões teológicas que escapariam de modo geral às pessoas. Meu intento é somente fazer com que se compreenda a posição da Igreja e o erro dos tradicionalistas reacionários.

Não nutro nenhum desejo de polemizar ou dialogar com esses grupos, que, de tão radicais, fechados e fundamentalistas, são impenetráveis a qualquer argumentação que não se enquadre em seus estreitos e pobres horizontes. Tentar dialogar com eles é como tentar dialogar com os protestantes fundamentalistas, sem tirar nem pôr. Nem mesmo freqüento tais sites, pois de modo algum valem a pena. Meu interesse é somente prevenir de modo argumentado e metódico aqueles que se sentem perplexos ante a aparente solidez da argumentação desses reacionários. Assim, cumpro somente com meu dever de defender a fé católica e ajudar o rebanho de Cristo para que não caia nas armadilhas que tantas vezes aparecem na sua peregrinação terrestre.

+++++

1. A situação da Igreja na segunda metade do século XIX e início do século XX

Para bem se compreender o modernismo e a reação do Papa em relação a ele, é necessário ter em mente a situação histórica da Igreja na segunda metade do século XIX e primeiras décadas do século XX.

Até a Revolução Francesa, a Igreja tinha o controle moral de todos os setores da vida humana: havia ainda uma sociedade de inspiração cristã em todos os seus grandes aspectos. Tudo mudou a partir da Revolução de 1789: foi nascendo uma sociedade fora dos limites da Igreja, uma sociedade industrial e urbana (com valores como o consumo, o sucesso, a intensa circulação de idéias e riquezas, o surgimento dos proletários e das idéias socialistas) animada por novas correntes filosóficas desligadas da tradição escolástica medieval (a filosofia agora não levava realmente Deus em conta: procurava pensar o mundo a partir de si mesmo, da imanência, sem voltar-se para o Transcendente); desenvolveram-se intensamente as ciências naturais, com seu método experimental (já não se prestava atenção na autoridade de quem afirmava, mas nas provas que eram apresentadas) e a ciência histórica, com o método histórico-crítico, que procurava reinterpretar criticamente as fontes históricas (assim, tendia-se a uma releitura dos fatos históricos a partir de um estudo crítico das fontes).

Diante dessa cultura moderna e estranha ao controle eclesiástico – muitas vezes até hostil e contrária à fé cristã -, a Igreja procurou erguer barreiras contra o mundo exterior. Toda esta situação de profunda e veloz mudança pegou a Igreja desprevenida, sem um instrumental teórico próprio para dialogar eficazmente com a nova situação, de modo que a Igreja se encontrou incapaz de enfrentar e argumentar com profundidade, serenidade e solidez em face às novas e urgentes exigências. Restou à nossa Mãe católica uma posição muito ruim: colocar-se na defensiva, sentindo-se como uma fera acuada; e, como toda fera acuada, atacou ferozmente procurando defender-se de uma situação que poderia destruir todo o fundamento da doutrina cristã.

Já o Santo Padre Pio IX (1846-1878) teve que enfrentar tal situação. Havia primeiramente a ferida aberta e supurante, provocada pela Questão Romana: a Igreja perdera os Estados Pontifícios, exatamente em nome das novas idéias sociais e da democracia... Isto gerava todo um estado de espírito de contraposição ao mundo moderno, fazendo a Igreja assumir uma atitude reacionária, já que se posicionava contra tudo que tivesse ligação com a “revolução”: idéias como democracia, liberdade religiosa, liberdade de consciência, luta pela justiça social, etc, eram vistas com infinita desconfiança porque eram defendidas exatamente pelos ambientes liberais e racionalistas que se contrapunham à religião cristã. O ideal, para a hierarquia eclesiástica, seria o impossível: a volta do Antigo Regime, da monarquia absoluta pré-Revolução Francesa. A mentalidade católica tornou-se, assim, reacionária, fechada, fossilizante. De uma Igreja que tinha sido tantas vezes criativa e propositiva na Antiguidade e na Idade Média, passava-se a uma mentalidade estéril e de retranca. Em 1864, Pio IX escreveu a Encíclica Quanta Cura e o Syllabus, um catálogo de 80 erros contemporâneos, contendo condenações generalizadas de tendências liberais dentro da Igreja. Só para se ter uma idéia da mentalidade de então: a 76ª. tese condenava quem afirmasse que o fim do Estado Pontifício ajudaria à liberdade da Igreja; a 80ª. tese negava que o papado pudesse se reconciliar com o progresso. Note-se que a Igreja foi assumindo uma atitude profundamente negativa em relação ao mundo atual, tornado-se não somente conservadora, mas reacionária mesmo – no sentido em que adota uma postura defensiva, hostil e negativa a tudo quanto vinha do mundo moderno... Na verdade, ela se sentia sempre mais perplexa ante uma realidade forte, difusa, a ela hostil e com a qual ela não sabia como estabelecer um diálogo ou neutralizá-la. Já aqui é necessário ressaltar que tal atitude da Igreja não foi culpa do Papa ou de quem quer que seja. Tratava-se de uma situação para a qual a Igreja da época realmente não estava preparada para e não soube como enfrentar essa realidade.

O sucessor de Pio IX, Leão XIII, tentou diminuir o abismo entre a Igreja e a ciência moderna. Ao menos na questão social deu um importante passo com a Encíclica Rerum novarum. Passo, sem dúvida, grande, mas nem de longe suficiente, para frear um afastamento sempre maior entre mundo e Igreja. Baste recordar a situação dolorosa do proletariado, o inchaço das cidades, o desenraizamento da população européia que agora deixava de ser rural e perdia seus referenciais... A Igreja não percebeu nada disso a tempo e a classe operária foi seduzida pelas doutrinas filosóficas de esquerda, sobretudo o marxismo. Uma outra tentativa do Papa para responder de modo intelectual às novas idéias foi restaurar o tomismo, isto é a filosofia da São Tomás de Aquino, valorizando a neo-escolástica, com a Encíclica Aeterni Patris, em 1879. Muitos eruditos católicos procuraram responder aos novos problemas a partir de São Tomás de Aquino. Um luminoso exemplo foi o Pe. Reginaldo Garrigou Lagrange, eminente teólogo dominicano. O problema é que o tomismo tradicional simplesmente não respondia mais às questões de modernidade. Era como a tentativa de colocar vinho novo em odres velhos... Toda genialidade e frescor de São Tomás – bem próprios e eficazes na Idade Média - foram engaiolados em fórmulas já prontas, em respostas mais ou menos engomadas, que realmente não satisfaziam e pouco diziam ante os grandes problemas colocados pela modernidade. A filosofia neo-escolástica parecia uma receita fria e irreal ante os problemas colocados pelas novas correntes filosóficas. Uma atitude positiva de Leão XIII foi ainda tomada na Encíclica Libertas (1888), na qual se pronunciou contra o “casamento do trono com o altar”, defendido pelos papas anteriores. Na França, chegou mesmo a incentivar uma política de aproximação entre os católicos e a república - coisa inadmissível para alguns papas anteriores.

A Leão XIII sucedeu Pio X, homem virtuoso e afável, que deu ao seu pontificado uma orientação proeminentemente pastoral: incentivou a comunhão das crianças e sua prática freqüente, promoveu o canto gregoriano e a catequese ministrada por leigos, preparou a codificação do Direito Canônico (promulgado depois por Bento XV), determinou a reforma do breviário e permitiu que os católicos italianos votassem – o que fora proibido no pontificado de Pio IX, desde que os nacionalistas italianos tomaram os Estados Pontifícios e unificaram a Itália. Foi no pontificado de Pio X que estourou de modo virulento a crise modernista, fazendo este Papa fechar-se mais ainda para o mundo de então.

2. O modernismo

Diante de toda esta situação, certamente, os desafios que o mundo colocava para a Igreja repercutiram profundamente dentro da própria comunidade católica. Muitos estudiosos e leigos mais conscientes procuraram encontrar respostas novas para os novos problemas. Havia realmente muitos que, procurando conciliar a fé católica com a nova mentalidade, terminavam por trair essa fé que procuravam apresentar de um modo novo. Mas, havia outros que, com equilíbrio, e sem se afastar em nada da essência do catolicismo, procuravam realmente, como o bom escriba de que fala o Evangelho, tomar do seu tesouro coisas novas e velhas: mantendo-se fiéis à Tradição, tentavam, no entanto, apresentá-la de modo novo, compreensível à sensibilidade de um mundo profundamente transformado. Este último grupo é chamado de progressista.

Infelizmente, ante a situação tão desafiadora e complexa, o Santo Padre Pio X, avaliou de modo extremamente negativo toda e qualquer tentativa de diálogo entre os católicos e o mundo moderno. Diante de tantas e tão velozes mudanças, o medo do Papa era que um diálogo da teologia cristã com as novas tendências viesse a dissolver o núcleo da fé católica. Sendo assim, sem separar nem distinguir os que se rendiam ao espírito do mundo (modernistas propriamente ditos) e os que com ele dialogavam, mas sem em nada ferir à Tradição (os progressistas), denominou a todos de modernistas e classificou a tendência de dialogar com as idéias modernas e a elas fazer concessão de ”modernismo”. Poderíamos dizer, portanto, que modernismo, de modo geral, é um movimento que desejava a reforma da Igreja e de sua doutrina para adaptá-las às exigências colocadas pela sociedade moderna. Observe-se que se trata de um conceito amplo demais, demasiadamente abrangente, englobando num só grupo segmentos e mentalidades realmente muito diferentes e, às vezes, incompatíveis. Pio X colocou a todos no mesmo saco! Na realidade esses teólogos católicos do fim do século XIX e início do século XX, conforme seu modo de pensar, suas idéias a respeito de reforma, sua origem e sua educação, pertenciam às mais diversas e até opostas tendências. O que os “modernistas” – como o Papa os chamava - tinham em comum era a vontade de superar o abismo que se abrira entre a Igreja e o mundo moderno, entre a teologia e a ciência.

O Santo Padre Pio X viu no modernismo uma perigosa irrupção do espírito do mundo dentro da Igreja e o definiu como o compêndio e o veneno de todas as heresias. Certamente, havia um bom número de pensadores que, no intento de dialogar com as novas idéias, terminavam por desfigurar a fé cristã. Uma posição bastante comum desse grupo heterodoxo era aquela de converter a experiência religiosa em critério decisivo da relação do homem com Deus. Isto em oposição ao conceptualismo da neo-escolástica oficial. Em palavras mais claras: para os modernistas radicais, a experiência religiosa, a religião, era uma questão sobretudo de sentimento, de subjetividade. Isto era gravíssimo, pois sendo assim, a religião já não era uma questão de verdade, mas simplesmente de sentimento, a revelação de Deus a Israel e em Jesus Cristo era reduzida a uma questão sentimental... Note-se que se fosse assim, Deus não se teria revelado e tudo quanto soubéssemos de Deus não passaria de uma idéia feita pelo próprio homem sedento de Absoluto. Tratam-se de idéias imanentistas, subjetivistas e relativistas, já que a verdade seria feita pelo próprio homem e teria o homem como critério. Com isto, já não teria mais muito sentido a Igreja como estrutura nem o Magistério teria alguma autoridade dada por Deus! Aliás, o próprio ser divino de Cristo terminaria colocado em xeque, pois o Infinito não poderia se manifestar diretamente neste mundo finito.

Em 1907, com o Decreto Lamentabili, Pio X condenou 65 sentenças dos dois modernistas mais famosos: o francês Alfred Loisy e o inglês Geroge Tyrell e na Encíclica Pascendi, o Papa procurou traçar um perfil do modernismo como um sistema completo, homogêneo, uma verdadeira síntese das heresias, criadas para aniquilar não apenas a religião católica, mas toda e qualquer religião. Já afirmei antes e repito agora que, assim fazendo, o Santo Padre colocou num mesmo saco gatos muito muito diferentes! A Pascendi juntava e reunia num único personagem – o herege modernista – características encontradas em intelectuais muito diferentes e até opostos entre si. O Papa afirmava ainda que a periculosidade dos modernistas seria tanto maior porque se disfarçavam com uma vida moralmente austera, porém motivada por orgulho e soberba. As medidas tomadas por São Pio X foram drásticas: os clérigos foram severamente exortados a voltarem à filosofia de são Tomás de Aquino; as dioceses deveriam constituir comitês de vigilância, que fiscalizariam publicações e ensino dos sacerdotes, devendo enviar relatórios periódicos a Roma; aos padres suspeitos somente seriam confiadas funções sem importância nem incidência; salvo com a permissão expressa, os clérigos não deveriam ir às universidades estatais, sobretudo não deveriam freqüentar os cursos de filosofia e de história. Ora, tal atitude dura de São Pio X despertou a reação áspera de alguns modernistas. Isto fez o Papa determinar, em 1910, o juramento antimodernista. Por causa dos duros protestos, Pio X dispensou do juramento somente os professores de teologia da Alemanha.

Como se pode imaginar, este foi um período muito triste na história recente da Igreja: (1) Triste porque a sociedade mudava rapidamente, desenvolvia-se numa velocidade vertiginosa, as novas idéias e as recentes descobertas científicas pululavam e a Igreja não sabia como reagir e muito menos como interagir com toda esta situação; (2) Triste porque um Papa santo, de coração manso e humilde e de profundo sentido pastoral, como foi Pio X, sentindo-se no dever sagrado de defender a fé católica, não conseguiu separar aqueles que realmente rendiam-se ao espírito das novas idéias sem discernimento (modernistas) daqueles que queriam dialogar com a nova mentalidade e aproveitar as novas idéias naquilo que tivessem de compatível com a fé cristã (progressistas). (3) Triste porque se criou na Igreja um terrível clima de tensão, desconfiança, fofoca, delação e perseguição. Foi um período no qual muitas vezes esqueceu-se a caridade e o respeito pelo irmão, prevalecendo a desconfiança e o mau juízo... Isto porque surgiram grupos integristas, que procuravam nos ensinamentos da Igreja e do Papa, de modo unilateral e infantil, resposta a todas as perguntas, inclusive as da ciência e da arte, bem como da vida particular e política: “Nós somos católicos romanos integrais, isto é, consideramos verdade absoluta não apenas a doutrina eclesiástica tradicional, mas também as orientações do Papa sobre coisas práticas, fortuitas, isto é, sobre todas as coisas e pessoas. A Igreja e o papa constituem uma unidade perfeita” (integristas) – estas são palavras de uma revista integrista da época. Claro que tal mentalidade nada tinha com a verdadeira Tradição católica! Tem-se aqui uma outra tendência herética, extremista: um ultramontanismo doentio e fanático, que desejava ser mais papista que o Papa! Contra quem pensasse diferente, os integristas eram agressivos e inquisitoriais. É deste ambiente terrivelmente fechado, fanático e reacionário que surgiu o Sodalitium Pianum (“piano”, aqui, refere-se ao Papa Pio X). Esse grupelho de ânimo intransigente era uma associação secreta (Sapinière) fundada e dirigida por Mons. Umberto Benigni, bispo sub-secretário de Estado, e considerava sua tarefa mais urgente desmascarar todos os modernistas, estigmatizá-los e providenciar sua condenação eclesiástica. Em outras palavras: tínhamos na Igreja um serviço secreto de informação e delação uma KGB... Infelizmente, esse grupelho recebeu apoio financeiro e moral de São Pio X, apesar de vários membrosda Cúria Romana serem contrários a tal grupo, que era fechado, exagerado, policiesco e tendente ao fanatismo. Graças a Deus essa confraria foi imediatamente colocado no canto pelo sucessor de Pio X, o Papa Bento XV, em 1921. Pio X apoiava tal grupo porque foi se sentindo cada vez mais sozinho e ameaçado no seu modo de avaliar a situação – realmente o Papa fechou-se demasiadamente, vendo perigo em tudo!

Não há dúvidas de que a situação era realmente perigosa e difícil. Os modernistas radicais colocavam sim em perigo a fé católica. Além do mais, o modernismo extravasou o âmbito meramente teológico: como escapadouro das ânsias represadas, desenvolveu-se também como modernismo político, que defendia o liberalismo, esforçando-se para imbuir do espírito católico as novas forças da democracia e das lutas sociais. Em outras palavras: havia pensadores católicos apoiando abertamente a democracia, a separação entre Igreja e Estado e várias das reivindicações sociais da classe operária – reivindicações que hoje todos pensamos normalíssimas, mas que na época eram inovadoras e revolucionárias. Ante a posição decididamente negativa do Papa, desabafava o modernista radical Ernesto Buonaiuti: “Tentamos trazer as doutrinas do catolicismo para mais perto do nosso tempo, falando a sua linguagem e expressando seus próprios pensamentos, a fim de que por esse contato a mútua semelhança, que vai longe, se evidencie. Não podemos acreditar que a Igreja continue considerando destrutivo o nosso programa. Em alguma tentativa de aproximação podemos nos ter enganado, e nesse caso não há nada que mais desejamos do que uma advertência paternal. Mas contra a nossa atividade, cheia de sacrifícios e abnegações, não se lance uma áspera e irrevogável condenação!” Na Alemanha, os católicos reformistas (que não eram modernistas e, infelizmente, foram tratados como tais), desejavam harmonizar a vida e a doutrina da Igreja com o progresso da cultura e da ciência, sem violar a revelação e a fé, nem as estruturas fundamentais da Igreja. Mesmo assim, também eles não escaparam da suspeita e das restrições.

Repito: tudo isto foi muito triste! Se tivesse havido espaço para o diálogo, se tivesse havido mais discernimento para separar alhos de bugalhos... Mas, nada disso: diante do perigo grande, sorrateiro, diante do inimigo cujo rosto era desconhecido e cujos contornos eram de difícil delimitação, a condenação foi taxativa e geral, levando a um duplo resultado negativo: (1) os modernistas realmente modernistas terminaram por romper com a Igreja, sendo excomungados e degenerando de vez na sua doutrina herética e (2) os moderados, que realmente não tinham em nada se afastado da autêntica fé católica e muitíssimo teriam contribuído para o diálogo são e correto entre a Igreja e a sociedade que estava nascendo, foram silenciados e obedeceram. O problema é que isto deixou a Igreja falando sozinha, trancada em si mesma, sem uma real incidência no mundo que caminhava por sua própria conta. Isso é muito ruim porque um Deus sem mundo termina levando a um mundo sem Deus! A teologia, assim engessada e reprimida, degenerou-se, ficando extremamente medíocre: os professores eram obrigados simplesmente a repetir velhas explicações e fórmulas das quais sabiam serem ultrapassadas e ineficazes para exprimir a fé, pois que já não serviam para alimentar uma piedade, um pensamento e uma pastoral que fossem sal e luz para o mundo tão transforamado... Muitos excelentes teólogos, homens santos e fiéis à Igreja, foram colocados sob suspeição de serem modernistas sem motivo algum; isto provocou muitos danos à teologia... Eis alguns exemplos: (1) O grande exegeta, Pe. Marie-Joseph Lagrange, OP, procurou aplicar os princípios do método histórico ao estudo da Sagrada Escritura e às origens do cristianismo, mas isto sempre harmonizando suas investigações progressistas (não modernistas) com o ensinamento oficial da Igreja. Apesar de toda sua prudência, foi objeto de denúncias pelos integristas reacionários e suas pesquisas foram imensamente prejudicadas. (2) No âmbito da filosofia, Maurice Blondel, católico sério e leigo consciente, quis apresentar a fé e suas conseqüências práticas com um novo vigor, utilizando o seu assim chamado “método da imanência”. Seu desejo era demonstrar que a fé é plenamente condizente com o homem moderno, pois que a revelação cristã seria a plenitude de uma aspiração natural e primordial do homem. Pois bem: em nome de um conceito errado atribuído erroneamente a Santo Tomás lido de modo capenga, Blondel foi denunciado como modernista pelos integristas de sempre, acusado de destruir e esvaziar a realidade sobrenatural e a gratuidade da graça de Deus. A mesma acusação seria feita ao grande Pe. De Lubac décadas mais tarde. Em síntese: tudo que não fosse a velha cantilena tomista cantada de um modo a-histórico, míope e conceptualista, era colocado sob suspeição pelos integristas que dominaram no pontificado de São Pio X. Resultado final de tudo isto: os graves problemas da relação entre fé e modernidade permaneceriam sem solução até que começassem a ser afrontados claramente e com coragem a partir do Vaticano II! É uma lição que deveríamos aprender: não adianta – mesmo com toda a boa vontade do mundo – colocar os problemas debaixo do tapete da história: cedo ou tarde ter-se-á que afrontá-los, de um modo ou de outro!

Somente a título de ilustração, eis alguns breves acenos sobre Alfred Loisy, que foi o mais conhecido dentre os modernistas. Era sacerdote carmelita. Pretendia sobretudo aplicar o método histórico-crítico também à história das origens bíblicas e da Igreja. Em seus cursos no Instituto Católico de Paris e em sua revista L’Enseignement biblique, seguindo a exegese protestante alemã, afirmava que Moisés não poderia ser o autor do Pentateuco e que os onze primeiros capítulos do Gênesis não pertenceriam ao gênero literário histórico. Depois, transcendendo a questão bíblica, procurou analisar a natureza dos dogmas na Igreja. Fê-lo relativizando de modo forte a revelação e o dogma. Na verdade, desejava confrontar o sistema vigente, a-histórico, da neo-escolástica com as idéias newmanianas sobre a evolução do dogma. Ele pretendia mostrar que a Igreja e o dogma não vão contra as intenções de Jesus, mas foram conseqüência de seu ensinamento. Afirmava, por exemplo, que a Igreja era a única forma pela qual, após a morte de Jesus, poderia sobreviver o anúncio do Reino pregado por Cristo. O que Jesus havia proposto somente poderia sobreviver com a adaptação às novas exigências históricas, com a procura de novas repostas para as novas situações que Jesus não havia previsto e, por isso, não tinha podido revelar aos seus discípulos. Justamente por isso os dogmas não constituiriam verdades caídas do céu, mas eram somente o produto da história. A identidade decisiva entre o Jesus e a Igreja não estaria na manutenção da mesma verdade, mas no fato de ambos estarem na mesma corrente de vida. Interessante aqui notar que a intenção principal de Loisy não era criticar, mas apologizar, defender a fé contra o protestantismo liberal de Adolf Harnack; só que os princípios que usou para tanto levavam à conclusões incompatíveis com a fé católica.

Esta é a complicação e a fraqueza do modernismo: muitas vezes eram intenções boas, intuições corretas, mas apresentadas de modo inaceitável para a fé, pois terminava por reduzi-la a um fenômeno meramente humano e imanente, sem vínculo objetivo e real com o Transcendente. Analisemos as afirmações acima: Loisy estava correto quando percebera que o dogma evolui na história – e isto sempre aconteceu na vida da Igreja – o Cardeal Newman, por exemplo, tinha-o demonstrado muito bem. O problema é quando o Carmelita atribui isso simplesmente a um dinamismo histórico, esquecendo que a Igreja é guiada pelo Espírito Santo que preside a esse processo e que tem um órgão próprio para avaliar e discernir, que é o Magistério do Papa e dos Bispos em comunhão com o Sucessor de Pedro. Como o teólogo carmelita apresenta as coisas parecia que o dogma era um produto do dinamismo meramente histórico e cultural, obra meramente humana, sem nenhuma participação de divina. Foi condenado e, posteriormente, radicalizou suas posições, afirmando que a revelação e a fé em Deus pareciam até se volatilizar. Não foi por acaso que Loisy se tornou cada vez mais racionalista, a ponto de negar a divindade de Jesus Cristo e reduzir a experiência religiosa a uma simples questão filantrópica e humanitária. Seu mérito foi ter levantado, no início do século XX, certos problemas que antes dele praticamente não tinham sido enunciados na Igreja. Apesar de todo o seu exagero e seus erros, sua obra abriu caminho para a posterior aceitação do método histórico-crítico na Igreja.

3. O período pós-modernista

Com uma perseguição implacável aos modernistas – fossem eles verdadeiros ou supostos -, São Pio X realmente conseguiu livrar a Igreja do tsunami que a cercava: aquela mentalidade nova e, muitas vezes, incompatível com o cristianismo. Como já foi dito, as duras condenações de modo amplo e sem matizes esterilizaram por um bom tempo a pesquisa dos exegetas católicos. Num clima assim, muitos, por prudência, se fecharam na erudição e na arqueologia. Somente a partir de Pio XII, com a EncíclicaDivino afflante Spiritu, começou-se, pouco a pouco, um pequeno ensaio de afrouxar mais as rédeas da exegese e de incentivar os exegetas no seu trabalho. O mesmo valeu para os teólogos e a teologia de modo geral, até então sob estrita e fossilizante vigilância integrista dentro da Igreja. Agora, já não mais se obrigava os teólogos a afirmarem que o dogma não tinham história. Alguns teólogos, como Chenu, Congar e De Lubac proppuseram uma rica e fecunda teologia fortemente enraizada nos Padres e na história da Igreja. Apesar de serem plenamente ortodoxos, ainda tiveram que enfrentar um clima de suspeitas em certos ambientes adeptos de um tomismo dogmático e fossilizado que, além de errar por pensar que o tomismo é a única escola de teologia realmente católica, defendiam uma interpretação de São Tomás que não era realmente fiel ao pensamento e às intuições do Doutor Angélico. Esses teólogos brilhantes foram colocados injustamente em linha de fogo, sua teologia foi denominada de modo pejorativo de Nouvelle Théologie, “Nova Teologia”, no sentido de ser infiel à Tradição eclesial. Graças a Deus esse importante grupo de teólogos, mesmo sofrendo incompreensões, manteve-se fiel à Igreja e levaram adiante seus estudos, que foram de inestimável valor para a renovação da e colocaram as bases para o Concílio Vaticano II. O próprio Papa Pio XII sofreu influência desses ambientes reacionários, chegando a desconfiar de alguns aspectos da teologia do Pe. De Lubac e condenando-os indiretamente na Encíclica Humani Generis. Em todo caso, uma certa abertura estava realmente em curso: tanto a eclesiologia como as relações entre a Igreja e a modernidade iam, aos poucos, sendo abordadas não mais simplesmente em termos jurídicos, mas iam sendo enfocadas de modo mais positivo, vital e dinâmico. O próprio Papa Pio XII começou a interagir com mais abertura em relação ao mundo circunstante. Começou-se a defender pacificamente – como o filósofo cristão Jacques Maritain – que a Igreja não deveria exercer uma tutela sobre o âmbito temporal. Isto ficara na Idade Média, por motivos históricos bem precisos e justificáveis; agora tal pretensão seria inconcebível!

Contudo, foi somente com o Vaticano II que a Igreja deu o passo decisivo na tentativa de dialogar com o mundo moderno. Antes mesmo dos documentos do Concílio, é importante salientar a própria mentalidade que dirigiu a Assembléia conciliar: o desejo de apresentar o Evangelho e a fé católica na plena fidelidade à Tradição mas, por outro lado, deixando de lado aqueles elementos não essenciais que eram expressões próprias de uma situação histórica ultrapassada. Distinguia-se a fé das expressões nas quais ela pode ser expressa; distinguia-se o que é doutrina normativa e definitiva, pertencente ao Depósito da Fé, daquilo que é contingente e pode ser mudado e melhorado – distinções que não puderam ser feitas por Pio IX e Pio X pelo clima envenenado da época da crise modernista. Assim, problemas como o ecumenismo, a questão exegética, a questão social, a liberdade religiosa, a avaliação das várias religiões não-cristãs, particularmente do judaísmo e do islamismo, tudo isto foi revisto à luz da nova situação histórica e de uma mentalidade não mais reacionária, mas, ao invés, positiva e propositiva. É importantíssimo notar que não se tratou de renegar o passado, de adulterar a fé ou de desdizer a doutrina no que tem de imutável, mas sim de ser fiel ao patrimônio perene da Mãe católica, apresentando-o, no entanto, de modo dialógico em relação ao homem atual. Isto a Igreja fizera já quando saíra do ambiente judaico para o mundo grego, quando deixara o mundo greco-romano para penetrar no mundo celta, depois, fê-lo novamente quando teve que interagir com o mundo germânico. Novamente iria fazê-lo agora, dialogando de modo crítico e construtivo com a mentalidade saída do iluminismo, do racionalismo e do cientificismo da modernidade. Neste novo horizonte, o Magistério eclesial pôde reavaliar com mais serenidade e profundidade várias das teses que no tempo da polêmica modernista foram condenadas como heréticas ou perigosas para a fé. Separando o joio do trigo, evitando os pressupostos filosóficos incompatíveis com a fé, os Papas e o Episcopado do pós-concílio, de modo sereno e decidido vêm fazendo este trabalho de discernimento. Muitas vezes o Magistério tem aprovado as novas impostações da teologia e da exegese e, outras tantas vezes tem repreendido, corrigido e até punido os desvios e erros. É isto que os tradicionalistas empedernidos (herdeiros da mentalidade integrista, mesquinha e tacanha do Sodalitium Pianum) e muitos teólogos excessivamente progressistas (herdeiros do modernismo, que falam num tal de “espírito do Concílio” para defenderem tudo quanto é teologia extravagante e contrária à fé) não conseguem entender. Quem tem seguido com seriedade e empenho os passos do Magistério da Igreja nas últimas décadas percebe claramente o cuidado de fazer constantemente este discernimento, bem como o belíssimo equilíbrio do Magistério dos papas recentes.

4. Os tradicionalistas reacionários

É todo este processo, certamente tão guiado pelo Espírito Santo como ocorrera nas demais épocas da história da Igreja, que os tradicionalistas não conseguem compreender. Agarram-se aos antigos documentos sem nenhuma perspectiva histórica, lendo-os como se a Igreja estivesse no final do século XIX e inícios do século XX. Vivem em guerra contra moinhos de vento. O perigo é que citam os antigos documentos sem conhecerem ou sem levaram em conta todo este contexto e, assim, de modo obtusamente fundamentalístico, impressionam os desavisados. Quantos jovens católicos bem intencionados, no desejo de serem fiéis à Tradição da Igreja, caem na armadilha desses diretores de museu eclesiástico! Aí, de modo tolo e com uma ignorância de dar pena, saem acusando todo mundo de modernista, impugnando teólogos sérios e importantes, como o Pe. De Lubac, que foi convocado para perito do Concílio pelo Bem-aventurado João XXIII, foi elogiado por Paulo VI, feito cardeal por João Paulo II e foi um dos principais mestres de Bento XVI.

Analisando com calma, pode-se afirmar – e eu afirmo sem medo – que a “igreja” (com “i” minúsculo) propugnada por esses tradicionalistas pouco tem da Igreja de Cristo, sustentada pelo Espírito: a visão deles é de uma igreja fossilizada, parada numa determinada época (e que não é a época apostólica), que não compreende as necessidades do mundo e nada tem a dizer a ele; é uma igreja medrosa, infiel ao seu mandato de ser sal e luz; uma igreja aleijada, que olha para trás e não para frente, ao encontro com o Senhor que vem; uma igreja que concebe o riquíssimo tesouro da Tradição como um baú velho, com respostas amareladas como as anotações de um professor repetitivo e preguiçoso, que morreu intelectualmente; é uma igreja que confunde o essencial com o acessório, a verdade com as maneiras com as quais esta pode ser apresentada; é uma igreja que coloca São Tomás acima da Escritura e dos Santos Padres, que coloca a Idade Média acima da época apostólica, que de modo desonesto desqualifica os papas do presente em nome dos papas do passado numa herética contraposição... É interessante que até mesmo a linguagem desses tradicionalistas, pouco amigos da Tradição, é empolada e afetada... Um sinal claro de que vão cada vez mais perdendo contato com a Igreja real é que se isolam do Episcopado e dos demais irmãos na fé. Interessante que, cheios de presunção, se arvoram em defensores e intérpretes da Tradição, função que Cristo confiou aos Bispos e, para tanto, os assiste com o Espírito Santo!

Para concluir. Elaborei este texto para esclarecer àqueles que, bem intencionados, ficam confusos ao lerem em sites tradicionalistas e reacionários – descendentes diretos dos integristas do Sodalitium Pianum - citações de antigos documentos do Magistério que parecem contradizer as afirmações do Magistério atual. Também quis explicar o que foi o modernismo e quais os seus perigos. Quis ainda mostrar como algumas coisas que foram condenadas em bloco pelo Magistério da época devido a precisas condições históricas, atualmente, purificadas, foram acolhidas e ensinadas pelo Magistério eclesiástico sem nenhuma contradição com a fé católica e a perene Tradição da Igreja.

Não tenho neste texto objetivo polêmico. Não perco tempo polemizando com reacionários, porque o reacionarismo é uma doença da inteligência. Pode-se ser tranquilamente conservador, pode-se ter esta ou aquela sensibilidade litúrgica, teológica, espiritual, mas ser reacionário impede o diálogo, mata a caridade e turba a compreensão. Meu escrito não é para os reacionários, mas para os leitores sinceramente católicos, fiéis à Igreja de hoje e de sempre que, frequentando meu site e meu blog, procuram orientação de alguém que deseja sinceramente estar em comunhão com o atual Sucessor de Pedro. Para estes dei-me a esta pequena fadiga deste texto. Se ajudar sentir-me-ei recompensado.

- Texto de Dom Henrique Soares da Costa, Bispo Titular de Acúfica e Auxiliar de Aracaju.